quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Cap. 67






_Do que está falando? Ela... – Estava perdendo os sentidos – Ela... Saiu com a Paula não foi?

   Buscava resposta em cada rosto ali, todos continuavam estáticos. De um segundo para o outro tudo perdeu a cor, suas pernas fraquejaram, seu coração bombeou mais rápido, sua boca ficou seca. Sentiu alguém o levar para o sofá, só conseguia ouvir o choro de Marisa, sua vista estava turva, tudo parecia um sonho.

_Onde está minha filha?
_Ela está no hospital
– Tatianna entregava-lhe um copo de água – Vai te fazer bem isso.
_Não quero
– Empurrou o copo, sentia sua voz ficar embargada, ao mesmo tempo desesperada – Eu quero minha filha. E não mintam pra mim, eu só quero a verdade.
_Calma aí. Ela está no hospital.
_E o que estamos fazendo aqui?
_O Leo ligar para nos avisar em qual hospital eles estão.
_Eles?!

_Vitor... A sua irmã também.
– Marisa conseguiu falar entre o choro.

   Naquele momento não estava entendo nada, estava recuperado e em um movimento só levantou-se, pegando a chave do carro, sendo impedido por Tatianna.

_Você não pode dirigir assim, Vitor!
_Me deixa Tatianna, é minha filha!
– Alterou a voz
_Então vou junto com você e levamos a Dona Marisa também.

   Sem pensarem em mais nada saíram dali. A todo instante Victor pensava em Luciana, ela deveria saber de tudo. Não tinha coragem de fazer isso, estava sentindo que algo de ruim acontecera com Gabriela.

***

   Após a cirurgia, Luciana ainda ficou na emergência ajudando. Um dos enfermeiros a chamou:

_Doutora, o Jonas que você na sala dele urgente.

   Já imaginava o que iria ouvir. Por ser um hospital particular não poderia maltratar os pacientes e nem devia mesmo que estivesse em um ambiente público. Bateu na porta e recebeu autorização, dentro da sala estava Jonas acompanhado de Micheline, a psiquiatra do hospital.

_Jonas, me chamou?
_Sim. Sente-se

   Fez o que ele pediu, estava assustada.

_Eu já imagino o porquê estou aqui. Gostaria de pedir desculpas, não foi minha intenção falar daquele jeito com a paciente...
_Não é sobre isso.

   Assustou-se, olhou mais uma vez para Micheline.

_O que está acontecendo?
_Luciana, preciso que você seja forte...
_O que houve?
_Antes de falarmos precisamos saber se ficará bem.
_Mas é claro Jonas, porque me pede isso?

   Os olhares de Jonas e Micheline estavam estranhos, Luciana não era boba, sabia que algo de ruim iria acontecer. Pensou em demissão, já estava esperando por isso há dias:

_Estou bem e vou ficar bem. Agora me falem.

   Micheline se aproximou dela:

_Houve um acidente, mas calma...

   Não ouviu mais nada, pensou em Victor e sentiu um arrepio estranho. Levantou-se desesperada.

_O que aconteceu com o Victor? Ele saiu de casa e... O que houve?

   As lagrimas já tinham vida própria em seu rosto, caíam livremente.

_Não foi o Victor, Luciana. Sabe, acidentes acontecem e estamos preparados para tudo, prova disso é o que vemos por aqui e...
_Fala logo!
– Sussurrou entre os dentes. – Foi o meu pai?

Micheline respirou fundo.

_Eu sou mãe e sei bem o que vai passar nesse momento de dor...

    Bastou isso para Luciana se desesperar, chorar incontrolavelmente. Uma das suas vidinhas, Gabriela ou Mariana?

_Qual das?
_A Gabi.
– Jonas sussurrou triste.
_Não...
– Olhou fazendo gesto negativo com cabeça – Ela estava em casa, está dormindo. Eu vou, vou ligar pra lá e confirmar... – Sacou o celular de um dos bolsos do jaleco, estava com as mãos trêmulas. Micheline tomou-o de sua mão com os olhos marejados.
_Eu sei que dói Lucy, mas precisa ser forte agora...
_Eu quero minha filha!
– Sua voz saiu embargada em meio ao choro.
_Calma Luciana!
– Micheline tentava de todas as maneiras acalmá-la – Ela está aqui no hospital. Foi um acidente automobilístico.

   As lagrimas de Luciana cessaram, um susto, um baque no peito acometeu-a.

   Não deixou falarem mais nada. Correu para a emergência, quanto mais se desesperava, mais sentia tudo se distanciar. Sua pequena Gabriela estava precisando dela naquele momento. Parou de correr quando estava perto, alguém apontou para a sala de espera, achando Victor, Tatianna e Leo, estavam sentados tristes. Ergueram o rosto e logo foram abraçá-la, porém, ela esquivou-se dos dois e foi em direção a Victor, que estava sentado sem forças para se levantar. Colocou as mãos na gola da camisa que ele usava, fazendo-o se levantar assustado, batia insistentemente no seu peito enquanto esbravejava:

_O QUE VOCÊ FEZ COM A MINHA FILHAAAA! VOCÊ A MATOU.

   Até então, Victor não tinha noticias de Gabriela, o desespero da esposa o deixou aflito, achando que ela soubesse de algo certo. Segurou as mãos dela, tentando impedi-la, queria puxá-la mais para perto, queria que Luciana encostasse a cabeça em seu peito e chorasse de dor. Suas lágrimas desciam e não teve mais forças, sentiu-se tonto e presenciando tudo em câmera lenta, viu Leo e Tatianna soltando as mãos dela, impedindo-a de fazer algo a mais. Victor sentou-se no sofá olhando para qualquer lugar, um olhar perdido, uma culpa o atormentando, sentindo a presenças de mais pessoas, ouvindo tudo distante.

Leo: _Calma Luciana!
Luciana: _ME LARGA! FOI ELE QUE DEIXOU ISSO ACONTECER COM A MINHA GABI. – Estava fraca, cansada.

   Aproveitando que Leo lhe segurava, Luciana fechou os olhos e foi perdendo os sentidos. Jonas e Micheline se aproximavam e colocaram-na sentada no sofá.

_Micheline, chama os enfermeiros.
– Olhou para Tatianna – Pega um copo com água para ela.

   Olhou ao redor e viu Victor do mesmo jeito que Luciana estava. Foi até ele, analisando-o.

_Victor, está tudo bem? Fale comigo.

   O choro junto com a fala de Victor não saía, parecia uma estátua, imóvel, olhando para o nada. Após alguns minutos, ambos foram se recompondo, caindo à ficha, mas ainda estavam em choque. Luciana chorava desesperadamente, Victor apenas observava tudo ao seu redor.

_Está mais calma? –
Micheline aproximou-se dela. – A Gabi está fazendo uns exames, mas logo deve ir pra enfermaria.

    Victor olhou rapidamente na direção das duas, algo bom fluiu em seu peito, queria sorrir mesmo em um momento tão tenso.

_Micheline, me deixa ver ela.
– Deixou as lagrimas correrem livremente.
_Eu até poderia, mas sabemos que isso é errado Luciana. Seu estado está crítico, você está mal.
_Não estou mais
– Limpou as lágrimas – Por favor, eu posso ajudar em algo, mas me deixa ver a Gabriela.
_Vamos ver o que posso fazer por você. Também sou mãe e entendo sua aflição.

    Sem pensar em mais nada, Luciana levantou-se e foi seguindo Micheline, antes de sair da sala, sentiu a mão de Victor tocando-lhe, pela primeira vez naquela noite, olhou bem nos seus olhos:

_Por favor, me dá noticias da Gabi quando puder.

   Virou o rosto enquanto bruscamente retirava sua mão da dele. Naquele momento tudo o que Luciana não queria sentir por Victor, infelizmente veio muito forte. Estava odiando-o por tudo, culpando ele mentalmente.

   Victor colocou as duas mãos no rosto quando sentiu que ela saiu daquela sala de espera. Entregou-se ao choro, ao desespero, não tinha noticias de Gabriela e sabia que sua esposa não faria nada para lhe deixar por dentro de tudo. Leo sentou do seu lado, tirando as mãos dele, apertando-a e com a voz embargada, sussurrar:

_Vai dar tudo certo nego véio. A Gabi é forte, esperta, foi só um susto.
_Eu sou o culpado de tudo isso, Leo. A Luciana vai me odiar pelo resto da vida.
_Não pensa em nada assim, vamos fazer uma oração forte para nossa pequena voltar bem.

   Tatianna olhou para eles, sentando do lado de Victor também para segurar uma de suas mãos:

_Estamos aqui firme e forte, Vih. A Gabi é esperta e tenho certeza que deve tá lá na sala de exames fazendo todos darem altas risadas.

   Os três sorriram ao lembrar da pequena Gabriela, tão esperta e cheia de vida, que fazia amizade rápido e era sempre bem quista por onde quer que passasse.

_Acho que alguém tem que avisar a Dona Marisa que está tudo bem com a Gabi.
_Também acho Tati.
– Leo levantou-se – Eu vou até ela, também quero saber noticias da Paula. Você fica com o Vitor, amor?
_Vai, eu fico aqui com ele.

   Mais uma vez Leo se aproximou de Victor, beijando-lhe o topo da cabeça e sorrindo:

_Vai dar tudo certo, Vitor.
_Eu sei.
– Resfolegou procurando conter o choro – Me mantenha informado sobre a Paula.
_Pode deixar.

   Victor olhou para Tatianna, respirou profundamente:

_Se quiser ir com o Leo, eu fico só.
_Não Vitor, vamos ficar aqui.


   Luciana sentia seu coração bater descompassado a cada passo que dava em direção a ala pediátrica, sempre presenciava cenas tristes de crianças machucadas, por conta de algum deslize de pais ou responsáveis por elas. Se lhe dessem naquele momento um papel de pedido de separação, ela assinaria sem dó nem piedade, uma fúria tomava conta do seu corpo, não sabia se isso iria passar, mas naquele momento sua vontade era de estapear Victor até cansar. Não estava entendendo nada do que se passava ali, se Gabriela fora acidentada porque Victor estava bem?

   Foi informada que Gabriela estava na sala de sutura, um medo percorreu dentro de si, queria e ao mesmo não queria ver como Gabriela estava. Qual grau era o estado da sua própria filha? Em passos lentos foi se aproximando da maca, sua filha estava gritando de dor e parecia que uma faca estava atravessando o coração de Luciana, ela já chorava antes mesmo de ver como a filha estava. Parou para se recompor, não poderia deixar transparecer nervosismo, a sua pequena não iria entender e se desesperar.

   Gabriela estava rodeada de enfermeiros que tentavam lhe acalmar enquanto um deles tentava limpar sua testa para poder iniciar a sutura. Deram espaço para Luciana se aproximar e ver a filha que estava com alguns ferimentos nos braços, arranhões por toda parte, assustou-se de imediato, mas por Gabriela conseguiu controlar o medo, segurando as mãos da pequena, que estavam geladas:

_Hey meu anjo. A mamãe chegou. Calma.

   Parecia que Gabriela estava vendo a solução da suas dores, chorou mais ainda ao ver a mãe:

_Mamãããee, tá doendo.

   Luciana colocou a mão na boca para segurar um suspiro de susto e choro, as lágrimas voltaram a cair com força em seu rosto.

_Eu sei meu amor, mas... Mas logo você fica boa e pra ficar tem que os deixar terminarem.

   Após intermináveis minutos, conseguiram finalizar os pontos na testa de Gabriela, que agora estava nos braços da mãe apenas soluçando enquanto se acalmava. Luciana olhou para a pediatra que estava no plantão:

_Por favor, me deixa ficar assim com ela.
_Eu sei Lucy, mas só faltam mais algumas coisas e logo ela vai para o quarto.

   Ficou ali observando tudo, às vezes olhava para a filha e não acreditava que Deus lhe dera mais uma chance. Lembrou-se da mãe e sentiu as lágrimas caírem forte em seu rosto. Sentiu Gabriela ficar mais calma e decidiu ir dar noticias a Victor, mesmo sabendo que ele não merecia tal ação vinda dela, mas Leo e Tatiana precisavam saber de algo. Foi até a sala de espera, Tatianna e Victor estavam calados, ao vê-la levantaram-se desesperados, olharam para o jaleco que Luciana usava, ele estava sujo de sangue.

Tatianna:
_E aí amiga?
Luciana: _Ela está bem. Só com alguns arranhões nos braços, creio eu que foram os estilhaços do vidro. – Sentou-se – Mas já já vai pra um dos quartos.

   Sentiu quando Victor suspirou, não queria e nem sentia vontade de olhar para ele, mas precisava saber ao certo o que acontecera. Olhou-o com uma expressão séria, Tatianna percebendo o clima, levantou-se com a desculpa que iria dar a noticia a Leo por telefone.

_O que aconteceu?
_Luciana, eu...
– Respirou fundo mais uma vez – Eu não sei.
_Claro que sabe, então pare de drama e me conte logo.
_Eu a levei para o jantar, antes de ir embora a Paula pediu para levá-la ao seu apartamento e eu deixei.
– Baixou a cabeça.
_E sequer ligou pra mim?
_Eu sei Luciana, deveria ter ligado, mas o clima entre nós estava estranho.
_Isso pra mim não é desculpa. Você errou Victor, já pensou se acontecesse algo pior com nossa filha? Seu orgulho vai ser o motivo da nossa separação, escreva o que estou te dizendo.

   Saiu sem olhar para trás, ainda estava lhe doendo os dias em que ele lhe tratara tão friamente, com desprezo. Aguardou a chegada de Gabriela em um dos quartos, agora sua pequena dormia calma, mas aqueles arranhões entregavam tudo o que ela passou. Victor estava próximo da cama, fitando cada traço do rosto da filha, não acreditando que tudo não passara de um susto. Aproveitando que ele estava ali, Luciana chamou Tatianna a parte.

_Como está a Paula?
_Está bem. Na hora da colisão ela só pensou na Gabriela, até fazendo os exames estava perguntando por ela. Leo me disse bem rápido pelo telefone que eles estavam certos quando o sinal abriu, mas veio um carro e bem no cruzamento bateu no carro deles.

   Luciana imaginou a cena.

_Acho que o carro bateu do lado da Gabriela, por isso o braço dela ficou marcado pelos estilhaços.
– Sentiu o choro tomar conta de si – Eu só queria estar no lugar dela pra não vê-la sofrer tanto. Partiu meu coração vendo-a chorar enquanto davam os pontos no rosto dela.
_Eu sei como é, Lucy. Tenho dois em casa e por eles também faria tudo isso. Não quero nem pensar se isso acontecesse com o Matheus ou o Antonio.
_Obrigada por estar sempre do nosso lado em momentos como esse, Tati.
_Imagina Lucy. Faço por vocês o que sei que fariam por mim.
_E o Fernando?
_Está bem, nada grave.
_Ainda bem.

   Jonas se aproximou, pedindo para falar a sós com Luciana:

_Luciana, vamos te dar alguns dias de folga.
_Não precisa, Jonas. Eu só quero essa madrugada ficar com ela, amanhã se tiver alta a Lourdes fica com ela.
_Imagina Lucy, tenho filhos e sei como é. Tire esses dias para descansar e cuidar da sua pequena. Aproveite e resolva seus problemas pessoais. Boa noite.

   Jonas se afastou deixando Luciana pensativa. Sua vida estava tão embaralhada que nem aqueles dias de folgas iriam ajudar. Estava farta e cansada de tudo o que lhe deixava triste. Victor ficaria no final da sua lista, o deixaria mais de lado, não estava suportando olhar para ele, queria distancia e a todo momento mesmo não querendo, seu coração o culpava por isso estar acontecendo na vida dos dois.

Continua...  

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