segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Cap. 28


 Still a little bit of your ghost your witness 
(Ainda há um pouco de seu fantasma, sua testemunha)

(...)

Stones taught me to fly 
(Pedras me ensinaram a voar)
Love taught me to lie 
(O amor me ensinou a mentir)
Life taught me to die 
(A vida me ensinou a morrer)
So it's not hard to fall 
(Assim, não é difícil cair)
When you float like a cannonball 
(Quando você flutua como uma bala de canhão)


                (Cannonball – Damien Rice)



   As mãos no quadril de Katherine, ela gemia alto, gritava pelo nome dele. Victor gostava de vê-la assim, até sorria sarcasticamente. Fechou os olhos enquanto investia brutalmente dentro dela, ao abri-los, Luciana estava perto deles, seus olhos rasos e com a mão na boca sem acreditar no que estava presenciando. Victor, permanecia fazendo os movimentos e sorrindo para ela...

   Acordou suado, ofegante, sua boca estava com um gosto amargo misturado a secura. Só naquela semana, já era a terceira vez que sonhava com essa cena. Seu coração batia descompassado, as palavras de Lourdes fizeram efeito sobre ele. Será que Katherine seria capaz de falar sobre o que aconteceu?

   Foi ao banheiro, encarou-se pelo espelho e ligou a torneira da pia, molhando a nuca e os pulsos. Voltou para cama e pegou o celular, olhou inúmeras vezes para aquele nome na agenda telefônica, iria ligar e implorar que sua amiga não falasse a ninguém sobre o que houve naquela madrugada. Katherine sumiu e não lhe mandava mais mensagem, tampouco ligava; ele também não conseguia, tinha medo, o melhor seria deixar que tudo ficasse como estava. Levantou-se e não perdeu muito tempo, foi ao escritório, o dia fora corrido, o inicio da noite começava e com ele uma mensagem:

“Kate: Preciso que você venha até o restaurante. Pode ser? Anote o nome”

   Tudo estava muito quieto e bom demais para ser verdade, Katherine estava em Uberlândia e um medo invadiu Victor. Respondeu a mensagem:

“É algo muito importante? Estou ocupado.”

   Melhor que fosse assim. Distância... Era isso o que teria que usar e pôr em pratica quando o assunto fosse Kate. No mesmo instante, recebeu a mensagem de resposta:

“Kate: Ahh que pena. Iria te apresentar o meu namorado.”

   Um sorriso involuntário surgiu nos lábios de Victor. A zona de perigo estava passando e ele estava tranqüilo. Com Kate namorando, aos poucos tudo voltaria ao seu lugar. Empolgado, respondeu a mensagem:

“Irei. Às oito está bom para você? Abraços.”

   Chegou em casa bastante animado, até sentiu saudades de Gabriela. Tomou uma ducha e trocou-se, antes de sair passou pela cozinha, Lourdes estava sentada assistindo TV. O encarou bastante séria; assustado, Victor foi até a geladeira, servindo-se com um copo de água, ainda de costas para ela, ouviu-a se pronunciar:

_Não acredite nela, Victor. Está apaixonada por você.

  Ainda de costas para a empregada, respondeu:

_Ela está namorando, Lourdes.
– Virou-se para encará-la. Lourdes agora fixava bem os olhos dentro dos dele.
_Não. Ela não está namorando porque essa noite ela lhe quer. Tome cuidado.

   Victor sentiu seu corpo tremer, um frio tomou conta de si. Desejou um “boa noite” rapidamente para ela e saiu as pressas. As palavras de Lourdes pareciam flechas de imediato, mas segundos depois, ele refletia e achava um pouco de razão. O certo seria ir preparado, iria dizer não a seja lá o que Katherine viesse lhe pedir.

   Antes de ir ao restaurante, passou na casa do irmão, Tatianna estava com Gabriela. Entrou e logo foi recepcionado por um abraço caloroso da filha, beijou-a e ficou alguns minutos mimando-a.

_Nossa, como está lindo. Vai onde?
_Vou a uma reunião.
– Olhou ao seu redor – Onde está o Leo?
_Ele saiu. Disse que voltaria logo.
– Tatianna olhou o relógio em seu pulso – Mas acho que não virá para o jantar.

   Victor respirou fundo, não sabia o que fazer nessa situação: Acalmar a cunhada e lhe passar conforto ou fingir que não sabia da traição do irmão.

_Bom.
– Levantou-se – Vou indo.

   Abraçou inúmeras vezes Gabriela antes de sair, já na porta do carro, entregou a filha a cunhada.

_Vitor. Você não está achando o comportamento do Leo estranho?
_Tati, comigo o Leo continua sendo o mesmo. Nas viagens também.
_De uns dias pra cá ele tá sempre ocupado, quando está aqui em casa fica estranho. Eu não sei mais o que pensar.

   Olhou para Tatianna e imaginou Luciana no seu lugar. Como seria se ele tivesse continuado com as visitas na casa de Katherine? Iriam permanecer juntos assim como Leo e Clarisse?

_Fica calma Tati. Deve ser algum problema que ele deve ta passando. Tenho que ir, obrigado por cuidar da minha boneca.
_Relaxa que do jeito que ela está
– Gabriela já estava com a cabeça encostada no ombro de Tatianna – Ela dorme rapidinho. Beijos.

   Antes das oito chegou ao restaurante, entregou a chave ao manobrista e foi procurar a mesa onde Katherine estava sentada, avistou-a sozinha e logo estranhou. Ela, ao vê-lo sorriu e levantou-se para cumprimentá-lo:

_Quanto tempo, sumido.
_Olha, quem não me ligou mais foi você.

   Ambos sentaram, Katherine tinha um brilho diferente nos olhos, estava nervosa, ansiosa, olhando para os lados.

_Então, onde está o sortudo?

   Mais uma vez ela olhou ao redor, suas mãos agora estavam trêmulas, seus olhos lhe entregavam tudo. Victor tocou a mão dela:

_Kate, está tudo bem?

   Rapidamente ela fixou-os para ele, sorriu levemente e encostou-se na cadeira.

_Se eu te disser que ele já está aqui, você acredita?

   Victor olhou para os garçons, todos lhe conheciam e ao passar por ele acenavam de leve, fazendo-o esquecer seja lá o que fosse e apenas lembrando de algo bom, sorriu.

_Porque está rindo?
_Sabe, é aqui que eu e Luciana sempre viemos, gosto desse restaurante e hoje me fez lembrar dela, esse clima sabe.
– Sentiu a amiga sorri triste e uma lagrima ameaçar cair. – Kate, voltando ao assunto, onde está o seu namorado?

   Mais uma vez observou ao redor, não achou ninguém que estivesse olhando para a mesa deles, estranhou.

_Se seu namorado for algum funcionário daqui saiba que não tenho preconceito algum. Para mim o importante é o amor.
_Ele está aqui, diante de mim.

   Custou para a ficha de Victor cair, olhou próximo a mesa e logo foi de encontro ao dela. Kate o olhava com ternura para ele.

_Kate...
_Ouça Victor, eu não tenho culpa, aconteceu. Eu achei que era algo passageiro, mas na verdade não te procurei por medo, eu estou sentindo algo muito mais forte do que uma amiga pode ter.
_Isso é loucura
– Baixou a cabeça
_Victor, por favor, apenas me dê uma chance.
– Limpou as lagrimas – Eu posso te fazer feliz e diferente da Luciana jamais irei abdicar do nosso amor por questões profissionais. Eu te suplico, me deixe te fazer feliz, juntos criaremos a Gabi...
_Já chega! Dessa vez você foi longe demais.
– Deu uma pausa – O que aconteceu entre nós foi passageiro e acredite, por causa disso, por causa daquela madrugada eu não estou dormindo por pura preocupação. Eu amo a Luciana. Com licença.

   Retirou-se da mesa e em passos largos foi até a porta, aguardou o manobrista vir com seu carro, tempo suficiente para imaginar o quão absurdo aquela historia fora. Katherine apareceu na porta, desesperada:

_Victor, por favor, me desculpa. Não era essa minha intenção, mas eu estou ficando louca, estou apaixonada eu...
– Percebeu que ele sequer olhava – Porra! Eu te amo e agora não quero ser ignorada.
_Infelizmente eu não posso retribuir esse sentimento, Kate. Amo muito minha esposa.

   Desesperada, Katherine segurou o braço dele para que a encarasse:

_Eu aceito ser sua amante, mas fiquei comigo. Estou implorando um pouco de amor pra não morrer.

   Victor desvencilhou das mãos dela, dessa vez estava encarando-a e no seu olhar existia fúria:

_Primeiramente, tenha modos e se dê o valor. Ame-se mais para não sair mendigando sentimentos. Amo Luciana, jamais quero cometer o erro de novo.
– O carro chegou – Adeus, Kate. Vamos dar um tempo nessa nossa amizade para quem sabe, usufruirmos o que resta dela. Abraços.

   Antes de entrar no veículo, ela o puxou, segurando o rosto dele com as duas mãos:

_Não me deixe, Victor.
_Eu já fiz minha escolha, desculpe-me.

   Ignorou-a e saiu rapidamente dali, sua cabeça fervia, latejava a cada bombeada do coração, podia ouvi-lo batendo apressadamente, como se tivesse participado de uma maratona. Da ultima vez em que aceitou dar uma chance ao amor e abdicar da amizade, acabou amando Luciana. Isso poderia acontecer naquela noite se tivesse continuado com a loucura de Katherine. Para ela, ser amante era normal, já estava acostumada a dividir seus homens com as esposas deles. Definitivamente não iria seguir adiante com aquela loucura. Seu celular tocou enquanto ele guardava o carro na garagem.

_Alô?
_Victor me escuta...
– Katherine estava desesperada, soluçando – Me dá uma chance.
_Esquece isso, Kate. Seria loucura.
_Uma loucura boa.
_Não Kate! Já basta a loucura que eu fiz naquela madrugada.
_Você gostou, eu senti isso enquanto transávamos e te dava prazer.
_Não vou mentir, eu gostei, mas agora não dá.
– Ficou calado ouvindo-a chorar – Eu já cometi uma loucura na minha vida ao ficar com Luciana, não vou te colocar em uma furada. Você é linda Kate e merece alguém que lhe dê valor. Descanse e amanhã verá que não era nada disso o que pensava. Às vezes confundimos os sentimentos. Boa noite.

   Não deu espaço para Katherine tentar lhe convencer. O melhor seria assim, deixar que ela ficasse sozinha e refletisse sobre a burrada que estava fazendo. Seu celular apitou uma nova mensagem:

“Lu_Amor: Está em casa? Quero vídeo chamada pq estou com saudades.”

   Respirou fundo, ainda tinha Luciana em sua vida. Ela não tinha culpa da burrada que o mesmo cometeu, mas não queria conversar com ela naquela noite. Após alguns minutos pensativo enquanto bebia um pouco de whisky para aliviar sua tensão, ligou o notebook, aguardou que ela entrasse on-line, o que não durou muito. Atendeu a chamada e percebeu que ela estava um pouco tensa, preferiu não perguntar nada:

_Oi
_Oi meu amor... Nossa, você está com uma cara esquisita, tudo bem?
_Sim Lu, só são problemas que estão me atormentando mas nada de tão sério.
– Esfregou os olhos – E por aí, como está?
_Ah, cada dia a saudade aperta mais.
_Falta alguns dias para o fim do mês, você tem que me dizer quando será o seu vôo de volta.
_É sobre isso o que eu queria falar, Victor...
– Olhou para o chão, de repente estava pensativa e com medo – Minha volta não será no fim do mês, mas nos primeiros dias de julho eu estarei aí.

    Dentro de si, Victor até ficou um pouco tranqüilo, mas algo estava lhe incomodando, descontar a tensão em alguém o deixaria mais calmo e Luciana era a peça chave. Por mais que quisesse, não iria conseguir se segurar, algo o tomava e logo ele se pegou falando alto:

_COMO ASSIM VOCÊ NÃO PODE VIR NO FIM DO MÊS? QUEM SÃO ELES PARA TE PRENDER AÍ?
_Victor, calma...
_ESTAVA CALMO ATÉ AGORA. VOCÊ TEM FILHA E MARIDO PRA TOMAR CONTA, LUCIANA! ACORDA PELO AMOR DE DEUS! SEU TRABALHO NÃO É TUDO NA SUA VIDA.
_E você quer que eu faça o que?
– Estava sentindo a voz cortar, iria chorar, disso ela tinha certeza.
_VOLTA PARA O BRASIL E QUE SE FODA ESSES FILHOS DA PUTA!
_Victor, está tudo bem por aí?
_AQUI SIM, MAS VOCÊ COMO SEMPRE, SENDO EGOÍSTA. ACORDE ANTES QUE SEJA TARDE DEMAIS E ACABE PERDENDO SEU MARIDO!

   Não conseguiu falar mais nada, Luciana já chorava compulsivamente, sentia uma dor no peito de tristeza, estava dividida entre sua carreira profissional e sua vida pessoal. Victor se arrependera de ter discutido com ela, sabia que estava jogando toda a raiva, que a mesma não tinha culpa e nem sabia sequer do seu rolo com Katherine. Soltou o ar pesadamente, agora queria que ela estivesse perto, para colocá-la no colo, mimá-la e pedir desculpas.

_Olha Luciana, não foi minha intenção. Desculpa, são os problemas aqui e eu estou jogando minha raiva em você.
– Também sentiu sua voz ficar rouca e logo uma vontade de chorar imensa. – Acho que quando você estava aqui tudo era mais fácil, até os meus problemas me ajudava a resolver. Eu sinto sua falta, Lu.

   Ouviu, viu e sentiu o desespero da esposa, que agora chorava alto, soluçava como uma criança. Baixou a cabeça e lembrou-se de tudo o que aconteceu naqueles dias, no momento em que a traiu por um momento de fraqueza.

_Me perdoa, Lu.

   Luciana calou-se, agora ficava olhando a tela do computador, limpando algumas lagrimas fujona.

_Hey, fala comigo? Estou ficando preocupado.

   Limpou a garganta e olhou para ele:

_Está ficando difícil para mim também, Victor. Estou ficando cansada, com saudades, meu psicológico afetado. Eu só queria ir logo pra casa e abraçar todos vocês, mas está complicado.
_Quer que eu vá te buscar? Enfrento o mundo para fazer isso.
_Não precisa. Apenas me conforta nessas vídeo chamadas, eu sei que está ficando difícil para você, mas tenta se imaginar no meu lugar. Só te peço uma coisa: Que me faça sorrir a cada vez que nos encontrarmos assim, pela internet, não faz o que você fez agora a pouco, ok?
_Tudo bem.
– calou-se por alguns segundos. – Então, vou aproveitar e te contar as ultimas da nossa filha.

   E assim ele a fez feliz mesmo que distante, arrancar risos e gargalhadas dela era a coisa mais fácil do mundo que Victor fazia. Esqueceu-se que existia Katherine e tantas outras na sua vida, seu foco agora era sua esposa, ela precisava dele. Passaram a madrugada conversando e após ver que Luciana estava já caindo de tanto sono, finalizou a chamada e também foi se deitar, aquela cama que agora estava fria, gélida e sem o cheiro de sua esposa estampado nos lençóis. Lembrou-se das palavras de Lourdes, mais uma vez ela falara a verdade. O primeiro passo já fora tomado, afastou-se de Katherine, agora era rezar para que a mesma não chegasse até Luciana e contasse sobre o que acontecera entre eles. Com muito custo, dormiu.     

Continua... 

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