segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Cap. 43


   Luciana tentava andar o mais rápido o possível naquele corredor onde suas paredes eram brancas, porém, a sua barriga de oito quase nove meses não a deixava tomar tal atitude.

_Vai com calma, Lucy.

   Leo tentava lhe parar, andando vagarosamente a fim de vê-la esperá-lo. Impossível, Luciana estava muito ansiosa, só iria acreditar nas palavras que o cunhado dissera – Horas atrás – de que seu esposo estaria bem, vendo a situação de perto.

Aquela noite fora torturante, foi obrigada a ficar de repouso, mas tudo o que queria era ver Victor, tocá-lo, saber se ele realmente estava bem. Podia sentir seu coração bombear forte, liberando toda a adrenalina que seu corpo estava pedindo. Suas mãos suavam frias, sua voz entrecortada, a garganta pedindo (implorando) por uma gota de água; mas não, Luciana não queria parar seu tempo por causa de um  desejo forte, ela sabia que toda essa sede era de ansiedade, sede de vê-lo. Pararam diante da porta de um dos quartos, inspirando profundamente, Luciana preparou seu psicológico para o que lhe aguardava. Já ouvia a voz de Paula falando algo engraçado enquanto Marisa sorria... Tudo estava bem, ela estava em seu paraíso sem ao menos ter cruzado o portal.

   Leo girou a maçaneta. Como em uma cena, tudo parecia ser em câmera lenta. Os olhos de Luciana percorreram por aquele quarto, achando Victor sentado na beira da cama, cabeça baixa. Seu corpo estava magro, ele estava abatido, triste, aflito, ela conseguiu ler sua alma sem ao menos cruzar os seus olhos nos dele e quando isso aconteceu, foi bem devagar. Victor ergueu o rosto e ao ver Luciana, parada, estática, na porta, tentou sorrir... Não conseguiu, um bolo se formou na sua garganta, os olhos automaticamente se encheram e foi ali que Luciana não se segurou, em passos largos foi até ele e passou os braços em seu ombro, agarrando-o com força, entregando também ao choro e soluços que pareciam não ter fim.

   Aos poucos percebeu que o silencio se iniciara, Luciana não queria olhar para nenhum local, tampouco afastar-se dele, o apertava mais e mais.

_Não me abandona nunca mais meu amor.

  Sentiu as mãos de Victor tocar-lhe a cintura e apertá-la como resposta, afastou o rosto para fitar cada traço do dele, um curativo estava em um dos lados do seu rosto.

_Quem fez isso com você?

   Entregou-se ao pranto mais uma vez. Alguém machucara o seu Victor, alguém muito malvado e que iria pagar.

Leo: _Bom, o médico deu alta. Vamos todos para casa.

   O clima era estranho, nos assentos traseiros, Luciana estava ao lado de Victor, sempre o olhando, acariciando seu cabelo grisalho, pensando em tantas palavras, tantos planos que teria pelo futuro... Iria amá-lo mais ainda, como se fosse uma segunda chance que a vida lhe ofereceu. Dessa vez não iria errar.

   Durante o trajeto voltando para casa, Victor conseguiu ver a luz do sol, a rua, as pessoas, crianças... Sentiu saudade da sua pequena Gabriela, agora iria ver sua filha, queria ficar vinte e quatro horas com ela. Como era bom ver a claridade do dia, as pessoas, observando cada traço, cada árvore, cada pedacinho de chão, coisas que no dia a dia ele deixava passar despercebido, tão longe dos seus olhos e de sua mente. Baixou a cabeça ao lembrar de quando entrou naquele carro, aqueles homens armados, falando coisas baixas. O veículo perdeu a velocidade e pela entrada da mansão, sabia que ali era sua casa, seu local onde jamais deveria ter saído.

_Chegamos.

   Com a ajuda de Luciana e de Marisa, ele desceu. Lourdes estava com Gabriela, a garota parecia sentir que algo acontecera ou talvez tenha sido a saudade que sentiu do pai todo esse tempo, em seus passos pequenos seguiu até ele que sentiu os olhos marejarem e sem pudor algum chorar enquanto abraçava-a. Não conseguia falar nada, algo o bloqueava, mas os reais sentimentos estavam ali, naquele abraço. Sentiu Lourdes se aproximar e abraçou-a forte, agradecendo por sempre estar ali, no momento em que todos precisavam.  

Luciana: _Venha, você precisa descansar.

   Todos subiram para o quarto, Luciana arrumava a cama enquanto Marisa lhe dava o comprimido receitado pelo médico. Como um efeito fora do comum, Victor sentiu os olhos pesarem, tempo suficiente para deitar-se na cama, sendo acolhido pelos lençóis que sua esposa o cobria e ainda dando tempo para ouvir:

_Descansa meu amor.

   Sentiu as mãos de Luciana em seu rosto, sua barba por fazer, um carinho gostoso que ele não sentia há muito tempo. Fechou de vez os olhos e embarcou em um sono profundo.

   Luciana ficou alguns minutos ali, acariciando Victor sem muito acreditar na sorte que o destino lhe ofereceu. Gabriela não queria sair de perto do pai, deitando do lado dele e olhando-o curiosamente, acabou dormindo ali. Deixando os dois, Luciana desceu e foi até Leo e o resto da família, Amaral já tinha chego e estava dando alguns detalhes...

Leo: _Eu voltei para buscar o carro de Luciana e não tinha ninguém na fazenda.
Marisa: _Como não suspeitamos, o novo caseiro, foi ele!
Paula: _Não podemos julgar, Mãe.
Marisa: _Como não Paula? O Vitor é seqüestrado, o caseiro que mal começou a trabalhar na fazenda some.
Amaral: _Vamos fazer todas as investigações. Mas estou aqui pra lembrar para vocês que todos terão que depor na delegacia, eles irão chamar aos poucos. Mas é só de praxe.
Leo: _Sabemos disso, estamos aqui prontos. Só quero que peguem quem fez isso.
Amaral: _Bom – Levantou-se do sofá – Por hoje é só. O Victor está bem e isso é o que importa. Tenho que ir.

   Após o detetive sair, o silencio predominou. Luciana não parava de pensar nas palavras que o doutor dissera naquela manhã, antes de saírem do hospital...

“O Vitor vai precisar de um bom tratamento. Ele está em choque, presenciou algo muito forte. Procurem um psicólogo para ele, quem sabe até um psiquiatra.”

   Seus olhos marejaram, não queria saber que Victor iria passar por tudo isso. Queria que ele saísse dessa.

_Acho que teremos que pensar em um bom psicólogo para Vitor. – Leo parecia ter lido seus pensamentos.
_Conheço alguns amigos meu. Irei providenciar isso ainda hoje. – Marisa levantou-se do sofá.

   Aquele dia foi o mais ansioso que Luciana teve em todo esse tempo. Não cansava de entrar no quarto e ficar horas zelando o sono de Victor, ele parecia estar desligado do mundo, relaxado e com uma feição calma.

   A noite se aproximava, Victor acordou e viu o céu no seu tom mais escuro. Levantou-se rapidamente só para fechar as cortinas, a noite lhe trazia péssimas lembranças. A porta se abriu e Luciana entrou no cômodo.

_Meu amor, que bom que acordou. – O abraçou forte para logo em seguida olhar detalhadamente cada traço do seu rosto – Ainda não estou acreditando que você está aqui.

   Victor queria poder dizer o mesmo, mas seu corpo estava trêmulo, com medo de qualquer barulho.

_Quer descer? Estávamos jantando.

   Rapidamente, ele fez um gesto negativo com a cabeça. Luciana sentiu a realidade, já passara por isso... A morte de sua Mãe de longe, fora a experiência viva do que Victor estava vivendo naquele momento.

_Victor, você não pode se fechar para o mundo. Estamos aqui para te ajudar. Sua Mãe e seus Irmãos fizeram questão de se mudar para cá, estão todos confiantes nessa sua recuperação.

   Victor afastou-se de Luciana e voltou a sentar na cama. Ela entendeu e saiu do quarto, voltando apenas com a bandeja com a janta. Era muito triste para ela ver seu marido tocando na comida só para demonstrar que estava se alimentando, não comendo muito e sem responder nada do que lhe falavam. Leo e Paula se aproximaram e ficaram conversando com ele, tempo suficiente para Luciana sair do quarto e colocar Gabriela para dormir. O local era perfeito – Quarto da sua filha – era ali que Luciana iria jogar seus momentos de dor, sem que seu esposo observasse. Pediu ele de volta, mas o queria por completo, sem ser meio Victor. Zelando o sono da filha, sentiu alguém bater na porta, entrando após ela autorizar.

_Vou para meu apartamento, qualquer coisa pode me ligar Lucy.
_Valeu Leo, mas acho que com a Paula e a Dona Marisa vou conseguir segurar as pontas. Onde está sua mãe?
_Está agora no quarto de vocês, quer ter um momento a sós com Victor. Quem sabe ele não fale algo.

Luciana buscou ar para seus pulmões.

_Vai ser difícil ele se reerguer.
_Mas nós estaremos aqui para isso.
_E vamos conseguir.
_Amém. – Beijou o topo da cabeça dela – Vou nessa, qualquer coisa me liga.

  Luciana esperou alguns minutos no corredor, Marisa estava conversando com Victor e ela não queria atrapalhar. Sem perceber, seu olhar estava no quarto de sua filha que estava prestes a nascer. Depois da morte de sua mãe ali era seu porto seguro, ali tinha o toque de Geovana em cada decoração. Aquele passado obsessivo não lhe pertencia mais, ela se fora e Luciana teria que entender isso. A porta do seu quarto abriu.

_E aí Dona Marisa?
_Está muito difícil. Victor chora quando lembra de algo. Ele terá que quebrar esse bloqueio, mas não consigo fazer isso por ele. Não consigo ajudar meu próprio filho – Limpou as lagrimas.
_Está tudo muito recente, Dona Marisa. Vamos ver com o passar dos dias.
_Tem razão. Vou me deitar, qualquer coisa me chame.

   Entrar no quarto estava sendo torturante para Luciana. Será que quando estava em depressão Victor também sentia o mesmo? Viu seu esposo ali, deitado com o olhar perdido. Aquele não era o seu marido, o homem cheio de garra que a fazia ficar entorpecida em suas qualidades. Passou direto para o banheiro, demorando na ducha e por fim, indo deitar-se. A barriga a incomodava, mas nada era mais incomodo, do que sentir Victor ali, encarando o teto naquela escuridão. Ficou de lado e tocou-lhe o rosto, deslizando os dedos na sua barba por fazer.

_Estou aqui Victor, não irei te abandonar nunca mais.

Não obteve respostas, suspirou e fechou os olhos, só conseguiu dormir depois que Victor caiu em um sono profundo. Acordou na madrugada com ele gritando, sentado na cama, palavras sem conexo algum saia da sua boca:

_NATANAEL!... LANA, VOCÊ O ABANDONOU... VOLTEEEE!

Correu pra acender a luz do quarto, ele precisaria de algo forte para refletir em seus olhos e ver que tudo não passava de um pesadelo. Luciana voltou rapidamente pra cama, sentou do lado dele, colocando as duas mãos no rosto dele, fazendo-o olhar para ela. Os olhos de Victor estavam marejados, lágrimas grossas caiam em seu rosto, ele tremia com o olhar perdido.

_Calma Victor, foi um pesadelo. Calma!

  O abraçou e sentiu Victor entregar-se de vez ao choro, soluçava, fungava, apertando-a mais.

_Vai passar meu amor. – Repousou uma das mãos nos cabelos da nuca dele, acarinhando.

   Victor ficara um pouco mais calmo, mas voltou a ficar trêmulo enquanto Marisa entrava no quarto. Luciana relatou tudo calmamente.

_Meu filho, fique calmo.

  Não existia abraço melhor que o de sua mãe. Envolvido nele, chorou mais uma vez, fechava os olhos fortemente tentando esquecer algo. Na sua mente como algo repetitivo, a imagem de Lana caída no chão, sem vida, com o olhar vago o encarando. Ela morrera olhando para ele.

   Victor tomou os remédios que sua mãe lhe oferecia e logo voltou a dormir. Aquela madrugada foi tensa para Luciana, seu sono fora embora e assim ela ficou até o dia amanhecer.

Aqueles dias estavam estranhos na casa, Victor exigiu a todos que deixassem as cortinas fechadas, não saia do quarto, acordava sempre nas madrugadas. Luciana estava esgotada fisicamente e mentalmente, mas jamais reclamando, acordava com um sorriso nos lábios ao vê-lo ali, do seu lado na cama. Sabia que Victor iria melhorar, tinha confiança disso. Lourdes lhe passou segurança e prometendo a ela cuidar de Gabriela e de Victor enquanto ela, naquele dia, foi a delegacia para depor. Relatou o que passaram, calmamente. Mas aquele homem lhe fitando, a deixava quase inibida de falar tudo, em um momento, interrompeu o depoimento dela:

_E o Vitor foi sozinho para fazenda. Porque deixou?
_Eu estava em depressão, havia feito pouco tempo que tinha perdido minha mãe.
_Mas sua depressão foi embora quando viu que seu marido estava seqüestrado? – colocou a mão no próprio queixo, em um gesto sarcástico – Interessante.

   Após seu depoimento, Luciana saiu da delegacia rapidamente, voltando para casa o detetive da família olhou-a estranho, o que a fez subir e mais uma vez como naqueles dias anteriores, preferir se isolar do mundo e apenas ficar zelando o sono do marido.

***

   Leo chegou com Luciana, após ela subir cumprimentou Amaral, perguntando logo como estava o andamento das investigações.

_Está tudo indo bem. O depoimento de vocês estão ajudando e muito. – Fez uma breve pausa – Me digam, existe alguém muito próximo que em algum momento quis ver o fim de Victor?
_Não. Todos os nossos amigos são do bem. Mas porque essa pergunta?
_Nada. E quanto a esposa do Victor?
_O que você quer insinuar, Amaral?
_Ah, ouvi conversas que eles estavam mal no casamento...


   Leo não acreditava no que estava ouvindo da boca do detetive. Estava julgando Luciana, a pessoa que mais fora atingida naquela situação toda. Olhou para Paula e Marisa, que estavam caladas, elas não poderiam estar concordando com o detetive, isso seria forte demais para ele... Leo iria defender sua cunhada com unhas e dentes e tirá-la daquela situação.

Continua... 

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